quarta-feira, agosto 03, 2005

algumas oposições clássicas, para não dizer clichês


Corneille/Racine:

Corneille. Por causa do nome. Corneille é mais sonoro, mais charmosamente arcaico que Racine. É menos botânico também.

Também gosto mais dos versos dele. O que é um detalhe irrelevante: Corneille, Corneille, Corneille.

Claro, Racine era melhor tragediógrafo. As ações são mais concisas; os personagens têm mais nuances, e nem Fedra, nem Nero ou Agamenon podem ser resumidos numa fala, como acontece tão freqüentemente em Corneille. Também tem quem prefira Racine como poeta; dizem que seus versos são mais naturais, menos eloqüentes. É verdade. A eloqüência de Corneille às vezes deixa os recitativos um pouco balofos. Mas Corneille era mais witty, e tinha o dom de sintetizar o drama de uma peça em dois ou três versos. Essas sínteses, tão artificiais, tão obviamente cherchées, eram o que ele fazia de melhor, e compensavam o excesso de retórica.

E ainda esse nome: Corneille, Corneille.

Garbo/Dietrich:

Dietrich. Quer dizer, não que haja entre as duas a fenda cheia de Gremlins canibais que separa uma Audrey Hepburn de uma Rita Hayworth. Ambas eram germânicas, belíssimias, inteligentes e, o melhor, não falavam bem de mulher. Mas Garbo não tocava violino, não sabia Goethe de cor. E eu passaria a vida casado com uma mulher que tocasse violino, recitasse poesia em línguas que eu não entendo e tivesse as pernas de Dietrich - desde que, claro, tivesse também a tolerância de uma Linda Porter. Mas e se Garbo também fosse violinista e soubesse Goethe de cor? Eu continuaria com Dietrich. I'm stubborn.

Pound/Eliot:


Eliot, claro. Simpatizo com Pound, principalmente a crítica. Mas ele não escreveu o "Prufrock"; nunca atingiu a perfeição de versos como "The dead tree gives no shelter; the cricket no relief"; e, o melhor, não ia a festas maquiado como um ator shakespeariano. Além disso existe alguma coisa de vulgarmente físico no Pound, e que está sublimado em Eliot. Claro, Eliot teve de pagar sexualmente por esse refinamento. Mas é só comparar os dois recitando, o estilo bruto do primeiro com a sutileza do segundo, para concluir que compensou.

Enfim, Eliot era um miglior fabro. Eliot era melhor, seguindo critérios poundianos.

Nescau/Ovomaltine: ...

Le Corbusier/Frank Lloyd Wright: Mies van der Rohe. Mais chic que o primeiro; mais conciso que o segundo. Mas Le Corbusier é incrível.

Chico Buarque/Caetando Veloso: Come on! Ovomaltine, é claro.

Clássico/moderno: Se isto fosse vinheta para programa descolado no GNT, diria "Clássico moderno", me achando espertíssimo. Quem sabe até ganhasse um biscoito Scooby. Mas como não é o caso, respondo: "Sabe Mies van der Rohe? Pois é..." Mies van der Rohe é o meu ideal de elegância contemporânea, se é que uma coisa assim de fato existe. E isso exatamente por ter sido classicista, sutilmente classicista. Por isso, meu conselho de leito-de-morte às gerações vindouras: Componham como Mies van der Rohe. Bolgueiem como Mies van der Rohe. Comprem roupas como Mies van der Rohe. (Só não tentem projetar como Mies van der Rohe, que geralmente não funciona.)

7 Comments:

Blogger Odorico Leal said...

Rodrigo, você gostou de alguma coisa em "De-lovely"?

6:29 PM  
Blogger rodrigo de lemos said...

Não, praticamente nada. As músicas estão horríveis. O que é a Alanis Morisette? E aquele não-sei-o-quê-Williams com cara de mongol? Só "Night and Day" me agradou. E "Love for Sale".

E se o Cole Porter era sem graça daquele jeito, nem queria ter conhecido. Parecia um bancário. Very dull.

Enfim, faltou muita coisa no filme. Ah, escrevi um post mês passado sobre.

E você, gostou? Falei mal sem piedade porque parece que não. Se gostou, desculpe a indelicadeza.

abraço

8:48 AM  
Blogger Odorico Leal said...

Rapaz, gostei de assistir. Mas tenho consciência de que, no geral, o filme é péssimo. Na verdade, não parece um filme de verdade. É mal feito. Filme de mentirinha. E aquelas pessoas destruindo as canções foi golpe baixo. Ainda assim, as coisas estavam tão bem naquele dia que eu vi com prazer. Ashley Judd, Ashley Judd, I can't take that smile.

Me indica um bom filme que se passe na década de vinte?

10:50 AM  
Blogger rodrigo de lemos said...

Oh, recorrendo ao óbvio: "O Anjo azul". Mas você já deve ter visto. Se não viu, corra. Arquetípico. E tem Fraulein Dietrich.

Dos outros que eu vi não sei o nome, e dos que eu sei o nome não vi. Tem um que passa às vezes na TV5 e que é legal; tem cenas de cabaré que são cool. Mas não lembro o nome
:-( . O outro é "Moderns", que eu não vi, não sei se é bom. Mas a capa do DVD é. Ultra art-deco. Sempre fiquei curioso para ver, desde um dia de inverno de 1988.

Ah, lembrei dum livro legal sobre os twenties. "Antes do dilúvio", do Otto Friedrich. Jornalístico, pulei a parte econômica e política, mas as histórias da nightlife da época são fantásticas. E tem entrevistas com velhinhas que viveram aquilo! Fun, fun, fun.

Ufa, como sou prolixo, Deus do céu!

11:22 AM  
Blogger Odorico Leal said...

"O Anjo Azul" e "Roda da Fortuna" são os que estão encabeçando a minha lista de dvds pra alugar já há um bom tempo. Mas ando tão preguiçoso. Uma lástima. Fico só esperando que passe alguma coisa na telecine classic, mas ultimamente só passa "O Eclipse" do Antonioni. E eu ainda não tive ânimo pra vê-lo. O último filme que aluguei foi "Jules et Jim", bobinho, bobinho. Chatóide. Mas deste fim de semana não passará. Vou alugar os dois primeiros da lista. Depois comento.

Abraço, my dearest

12:07 PM  
Anonymous Anônimo said...

Putz, o "Jules et Jim" me perturbou na época em que vi. Achei muito doente aquela relação dos três. Não tenho vontade de revê-lo. De-lovely é realmente De-sgusting. Mas, em alguns raros momentos, é um pouquinho divertido.
Rodrigo, quem é Mies van der Rohe?

6:13 PM  
Anonymous Anônimo said...

eu tb gostei do jules e jim, adriano. achei chamroso. a matter of taste, of course.

ah e quer ver o tamanho do meu mies van der rohe? clica no meu nome. as imagens são great.

7:59 PM  

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