segunda-feira, abril 18, 2005

akitas brancos não sabem enterrar


a pior experiência que já tive foi trabalhar. trabalhar, não; fazer estágio (prefiro assim: parece que foi obrigatório e dá um pouco da auto-contraditória "dignidade universitária" à coisa). a prefeitura precisava de gente que soubesse inglês e francês para receber turistas; o horário era bom; a remuneração, nem tanto; mas eu acabei aceitando mesmo assim. o que foi um erro. ao fim de seis meses, a aventura me valeu um intenso tratamento com prozac, monty python e doses esparsas de pornochanchada brasileira.

porque, céus, aquilo era triste demais. o que mais me deprimia no tal "contato com o público" não eram nem as mulheres pançudas, estufadinhas nas sua miniblusas de lycra; nem a grosseria de pais de família gordos e bigodudos, querendo saber preços de churrascarias; nem as gírias que adolescentes espinhentos forçavam pra dentro dos meus augustos ouvidos, num dialeto semi-bárbaro que lingüistas insistem em chamar de "variação do português". não, não, o que mais me deprimia era a freqüência com que senhoras viúvas, mal vestidas e entediadas, apareciam no meio da tarde só pra saber "o que tem de bom pra fazer na cidade." é claro que não tinham a mínima intenção de fazer nada daquilo que lhes informávamos. em compensação, quando viam o folheto de mais uma pizzaria nova no partenon ou, sei lá, de um circo (sim, um circo!) passando pela cidade, que emoção! eram exclamações de prazer orgástico: "olha, que maravilha!", "mas esta pizza tá com uma cara muito da boa. se não fosse de papel, já ia querer um pedaçinho!", e riam forçado, mostrando ao mundo as suas dentaduras meio amareladas.

mas havia "clientes" que eu atendia com prazer 1) jovens de porte atlético; 2) akitas brancos. principalmente estes, que são tão atraentes quanto os primeiros, mas ligeiramente mais espertos. enquanto meus rudes semelhantes humanos queriam saber se servem bastante comida no baile da cidade ou qual é o tamanho do chopp no bar do edinei, os akitas pediam licença, esfregavam as patas no tapete, e pegavam apenas os horários das apresentações da orquestra sinfônica. ou então, vinham simplesmente para conversar. sobretudo sobre livros e visconti. às vezes, queriam alguma dica sobre bons restaurantes franceses, e houve um - hoje sei: meio metrossexual - que pediu o telefone do jacques janine. fiquei emocionado. e que elegância tinham eles ao sentar! sentavam nas poltronas da sala de espera, as pernas cruzadas, o rabo curvo pro lado, fumando cigarros belgas e olhando a nossa eterna deselegância simiesca com um sorriso de cruel ironia.

algumas colegas se queixavam desta atitude principesca; houve uma que se sentiu inexplicavelmente ofendida quando o mais franco perguntou se ela pintava o cabelo de loiro ou se era peruca mesmo; mas eu me aproximei muito destes animais tão nobres e fascinantes, e foi o mais perto que cheguei do robert de montesquiou. isso porque, se podiam ser cruéis, de uma inteligência aguda e sádica, eram muito fiéis quando simpatizavam com alguém. e simpatizavam comigo. não foram poucas as ocasiões em que algum deles me esperou ao fim do expediente, me levou de choffeur até um restaurante caro, ordenou que tocassem debussy ao violino, e ainda pagou a conta no final. nunca tive amigos tão bons, ou seja, com tanto dinheiro e bom gosto.

quando fui demitido por vagabundagem (passava o tempo todo lendo henry james e recebendo meus amigos no horário de trabalho), perdi o contato com muitos deles - acho que é porque a aristocracia tem a saudável mania da independência. mas me sobraram as fotos. partilho com vocês agora algumas das que me trazem as melhores lembranças:



meninas, acalmem-se: este não é o david beckham (apesar de a posição do rabo dar margem a confusões). é só um amigo que veio me buscar pra jantar (sushi, é claro) depois de uma tarde no jacques janine. ele tem este hábito estranho de ir a salão de beleza quando sabe que vai ser fotografado.
(ah, não dá pra ouvir, mas o que estava tocando de fundo era erykah badu. não, não, ele não é gay.)



notem a elegância dos dois vendo "o leopardo". principalmente a maneira de o branco juntar as patas dianteiras; sem dúvida, isso só se aprende lendo com esmero "o cortesão" .
mas não, eles não são nada empolados. e os dois foram a melhor companhia que já tive no cinema; eles SABEM assitir a um filme. por exemplo, pela língua estirada e as orelhas em pé, dá pra ver que estamos na cena da valsa entre a claudia cardinale e o burt lancaster. claro, os dois ficaram emocionadíssimo; mas, no final, chegaram até a esconder os olhos entre as patas, por acharem vulgar demonstrar arroubos emocionais em público. não seríamos todos mais felizes se pedagogas que choraram em "invasões bárbaras" se pautassem pela mesma etiqueta?
a pouco revi "o leopardo"com um amigo. comentários: "orra, que filme parado"; "puta gostosa essa mina; porque não msotram ela pelada?!".
ah: akitas não ouvem rap."

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

ei....
me fale alguma coisa sobre os macacos!!!

:wo-hooooo

4:45 AM  

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